sábado, 27 de janeiro de 2018

Como um Coxinha de classe média pode ser mais pobre do que um mendigo de rua

Coxinhas, me lembrei de um texto que li a algum tempo atrás.

Ele falava de patrimônio das pessoas, mas não só incluía bens, como também incluía as dívidas nas contas do patrimônio. O resultado era deveras curioso.

Sabem que muitas, realmente muitas, pessoas de Classe Média (isto inclui muitos de vocês, Coxinhas) são mais pobres do que os mendigos das ruas?

- Mas eu moro em um apartamento de 4 quartos, tenho um carro de luxo, TV LED de 60 polegadas, computador, celular, como posso ser mais pobre do que um mendigo de rua?

- Está pagando prestações destas coisas? Pagou tudo à vista? Sim, algumas coisas paga à vista, mas e o carro? Quantas prestações faltam para quitar o carro? Foi em consórcio? E o apartamento? Ele é financiado ou paga aluguel?

Mesmo prestações de um celular são parte de uma dívida, e entravam nesta conta como valor negativo. Carros e apartamentos podem ser tomados caso estas dívidas não sejam pagas. Então, até que estas dívidas estejam quitadas em definitivo, eles não são definitivamente seus.

E o mendigo da rua? Aquele que não tem nem casa para morar. Que carrega em um carrinho todos os seus pertences. Fora exceções, não tem conta em banco, não tem empréstimo imobiliário, não tem cartão de crédito, não tem nenhuma instituição financeira oferecendo empréstimo a ele. Não tem nada disto, e não tem grandes dívidas. Sei que tem alguns que entraram nesta situação por dívidas, mas são poucos, e uma vez nesta situação, dificilmente oferecem alguma forma para ele se endividar.

Nos EUA tem pessoas de mais de 50 anos ainda pagando os empréstimos que pegou para pagar a universidade que cursou 30 anos antes. Muitas destas pessoas, nesta conta que falei, o resultado costuma dar negativo. Sim, ela deve mais do que todo o seu patrimônio junto. Isto estava levantando a hipótese por lá se realmente valia a pena fazer uma faculdade.

No Brasil tem campanhas contra a Universidade Pública e Gratuita. Será que não é para implantar um sistema de empréstimos (ou, melhor falando, dívidas) estudantis? Será que não seria para criar mais uma forma de explorar as pessoas com juros de dívidas?

O que definiria classes sociais? Existem vários parâmetros que podem ser usados. Em um destes parâmetros existe uma classe no topo, aquela que tem dinheiro para comprar um apartamento de 4 quartos à vista. Que compra qualquer coisa à vista.

As classes abaixo disto podem ser definidas pela sua capacidade de endividamento. Quanto ela pode ser explorada por juros de empréstimos, financiamentos etc, antes que sofram uma falência pessoal, antes que tenham sérias dificuldades de pagar as suas dívidas e de se sustentar. A classe média costuma ter uma boa capacidade neste aspecto, mas tem casos extrapola.

Sistemas de Proteção ao Crédito, limites de empréstimos etc, não servem só para proteger as pessoas, impedindo que elas contraiam mais dívidas do que possam pagar. Servem também para proteger o sistema financeiro, garantindo que a grande maioria dos empréstimos sejam pagos. Um dos motivos da Crise de 2008 foi o endividamento de muita gente além da sua capacidade de pagamento, da sua capacidade de ser explorada através de juros de empréstimos. Isto aconteceu por uma série de motivos, entre eles a ganância e um afrouxamento deste sistema de controle de empréstimos.

A nossa sociedade está moldada para que as classes mais altas, aquelas que compram o apartamento de 4 quartos à vista, explorem as outras classes, desde que elas tenham uma capacidade de endividamento, uma capacidade de pagar juros.

Os mendigos das ruas não tem fonte de renda, geralmente não trabalham, então é nula a sua capacidade de ser explorado por dívidas. Muitos até pegariam empréstimo, se lhes fosse permitido, mas não tem capacidade de pagamento, então não interessa emprestar a eles.

Assim mendigos, por não terem dívidas, podem estar com um saldo positivo se fizer as contas de patrimônio menos dívidas, enquanto muitos de classe média estariam no negativo.

E existem armadilhas de endividamento, e a nossa sociedade está cheia delas.

Uma delas são aquelas tentações, especialmente por símbolos de status social, como ter um carro de luxo, um apartamento grande em um bairro caro, celular de marca famosa etc. Na realidade são armadilhas de consumo criadas com a ajuda da propaganda ("Tenha o carro tal senão você é um nada.", por exemplo). E no processo criam uma pressa, uma "necessidade" (é mais um desejo) de ter logo estas coisas, coisas que nem sempre são necessárias. E como muitos adquirem estas coisas? Por financiamento, pagamento de crediário, parcelamento etc, e neles tem juros embutidos.

A sociedade de consumo é toda uma grande armadilha. Bens duráveis não muito duráveis, e/ou que não tem manutenção fácil. Incentivo para comprar um novo ao invés de consertar quando dá defeito. Dificuldade de comprar peças para a manutenção de equipamentos. Etc. E, junto a isto, todo um processo de ilusão de prestações baratas, que no final acaba embutindo juros. Mantendo as pessoas endividadas.

Junte a isto a facilidade de conseguir empréstimos. É possível fazer empréstimo em caixa eletrônico de banco, a qualquer dia e hora, sem ter que assinar qualquer papel e sem ter que falar com qualquer funcionário do banco. Em alguns bancos nem precisa andar pelos menus do caixa eletrônico. Colocou o cartão e já oferecem empréstimo (Coisa que, na minha opinião, deveria ser proibida.). O sistema do banco calcula automaticamente, segundo quanto entra na sua conta mensalmente, se tem renda fixa etc, quanto você pode pegar de empréstimo. E agora tem até como pegar empréstimo via aplicativo de celular.

O cheque especial também é um empréstimo pré-aprovado, que se pega quando extrapola o saldo da conta. Também tem um o cartão de crédito, que cria uma facilidade de pagamento, mas também cria uma facilidade de gastar demais, e assim se endividar, pois existe nele um mecanismo automático de empréstimo com juros altos.

Muita gente cai nestas armadilhas, e repetidas vezes. Já soube de gente com mais de 60 empréstimos consignados, daqueles que são descontados em folha de pagamento.

E assim muitas pessoas acabam devendo mais do que tudo o que tem, portanto, se tronam mais pobres do que mendigos.

Bem vindo ao Capitalismo Financeiro, no qual tiram Mais Valia de você sequer te contratar, sem ter que ser o seu patrão.

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