domingo, 7 de outubro de 2018

A armadilha número 2 da China

O Japão era um país arrasado no pós guerra. De uma potência industrial ele tinha se tornado um país subdesenvolvido, empobrecido. Era uma boa fonte de mão de obra barata. Isto atraiu indústrias. Mas o país tinha também uma experiência industrial, o que pode ter ajudado.

Vendo oportunidades de negócio com tecnologia o Japão se desenvolveu e ganhou um papel importante na indústria eletrônica mundial. Em boa parte foi por causa do boom do transístor. Pode-se falar que o rádio transistorizado foi um dos símbolos deste desenvolvimento.

Existe até uma lenda de que, quando alguns japoneses estavam negociando o uso da tecnologia do transístor, um dos americanos perguntou para os japoneses para que eles queriam aquilo. A resposta foi "Para fazer rádios de bolso.". Nisto os americanos caíram na gargalhada. Poucos anos mais tarde quase todos os moradores dos EUA tinham um rádio de bolso japonês.

No filme 1941 tem uma cena que faz alusão a isto. Depois de não conseguirem fazer um rádio valvulado passar por uma escotilha do submarino, um japonês fala para outro "Temos que miniaturizar isto.".

A mão de obra barata do Japão no pós guerra, mais a cultura industrial que tinham antes, podem ter ajudado a reindustrializar o Japão e torná-lo uma potência econômica e tecnológica em algumas décadas.

Mas o Japão era limitado. É um país pequeno, em uma área pequena, montanhosa em boa parte, com uma mão de obra numericamente não muito significante a nível mundial, e com grandes deficiências de matéria prima e fontes de energia.

A  China, por outro lado, tem muita mão de obra, e barata por diversos motivos, inclusive por diferença cambial. A China tem quase 20% da população mundial. A China tem uma boa parte da matéria prima que precisa, uma grande área geográfica, grandes fontes de energia (A Hidrelétrica das Três Gargantas é um exemplo disto.). Então a China pode empregar um modelo parecido com o Japonês do pós guerra, mas em uma escala bem maior. E assim o fez.

Boa parte da produção industrial do Mundo migrou para a Ásia, especialmente para a China. Na gana de produzir barato, usar mão de obra barata, grandes escalas de produção etc, muitos países passaram por uma desindustrialização. Fábricas foram fechadas e suas produções foram migradas para a China. Alguns produtos novos, pois tivemos um novo boom de tecnologia nos últimos anos (Smart Phones são um exemplo disto.), praticamente não foram produzidos fora da China.

Como uma indústria costuma depender de outras indústrias, as fábricas fora da China que não foram fechadas podem ter passado a depender de produções de peças na China. As fábricas de onde elas compravam peças e insumos podem ter fechado, ou ela mesmo decidiu por comprar peças e insumos mais baratos produzidos na China.

A competição típica do capitalismo pode ser a sua vantagem e a sua desvantagem, e até mesmo a sua ruína.

A China teve um grande crescimento econômico nas últimas décadas explorando isto tudo.

Aqui está a primeira armadilha. Concentrar muito da produção em um lugar.

Em 2011 uma grande inundação atingiu um parque industrial na Tailândia. Muitas fábricas foram inundadas. E, mesmo as não inundadas, tiveram sua produção afetada por diversos motivos, desde ficarem isoladas até seus fornecedores serem inundados. Entre as consequências estão falta de HDs no mercado, atraso de lançamento de produtos novos etc. Se os HDs acabassem no mercado os computadores não poderiam mais ser vendidos.

Com a China se tornando virtualmente o parque industrial do Mundo, um dia ela poderá ditar o preço dos produtos. Se ela aplicar sanções comerciais a um país, este país terá sérios problemas para adquirir uma série de produtos, e terá que adquirir através de atravessadores de outros países, o que encarecerá. Fábricas de automóveis, que são espalhadas pelo mundo, poderão paralisar, pois muitas peças vem da China.

E assim se consolida a primeira armadilha. As indústrias do mundo estão nas mãos da China.

E a segunda armadinha?

Se você usa algo que você não tem o controle, não sabe como é produzido, como funciona, não tem como saber se ele está realmente fazendo o que deve fazer, e como deve fazer. Não tem como saber se está fazendo algo a mais.

Os defensores do Software Livre falam muito disto. Um Software Fechado não lhe permite auditar, criticar como ele é feito etc. Desenvolvedores de Software Fechado podem colocar código de espionagem dentro dos programas e será difícil de auditar para saber que ele existe. O Software Livre pode ser auditado, e pode ser instalado à partir do que foi auditado.

Durante a Guerra Fria a CIA teve a ideia de modificar as fotocopiadoras nas embaixadas da União Soviética para fotografar todos os documentos que passassem por elas. E aparentemente depois não se restringiram à elas. O uso de equipamento fabricado, e mantido, por empresas dos EUA criou uma grande vulnerabilidade de segurança.

Agora, a ideia atingiu outro nível.

Placas mãe de milhares de servidores pelo mundo, que foram fabricadas na China, foram modificadas para introduzir um chip extra para espionar quem usasse este servidor.

Isto faz pensar. Quantas outras placas mãe foram modificadas para isto? Tem de outros fabricantes? E os notebooks e computadores de mesa? E os celulares, já que 90% dos celulares do Mundo são fabricados na China.

Será que é assim que começa uma Guerra Fria cibernética. E uma guerra cibernética real? Imagine em um ataque a um país boa parte da infraestrutura e das comunicações pessoais são desativadas?

Sim, colocar os outros países para fabricar as suas coisas, se abster de dominar a tecnologia da qual depende, é muito perigoso.

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