sexta-feira, 27 de março de 2015

Educação utilitarista

O personagem dos quadrinhos Armandinho é sensacional, e o autor nos faz pensar em coisas que normalmente não pensaríamos, com críticas muito legais, geniais. E esta aqui me chamou a atenção para um um problema sério no ensino brasileiro. Ela pode ser interpretada de muitas maneiras possíveis.

Horas depois de ver este quadrinho eu vi uma coisa um tanto absurda em um grupo com quem eu convivo. Um fala algo engraçado, que não ouvi direito, mas tinha o trecho "dar um tapa na mesa" ou "bater na mesa". Aí eu falei:  "Se não der uma de Nikita Khrushchov, por mim tudo bem.". (Se você está dando gargalhadas neste ponto, parabéns.)

Neste momento um bando falou "Eim?", "O que?" etc, e para piorar uma pessoa falou "Quem é ela?" (Eu exagerei o "a" aqui para verem bem.). Ninguém entendeu. Eu perguntei "Não conhecem?". O máximo que conseguiam lembrar era a personagem do seriado "La Femme Nikita", e talvez dos filmes (Eu conheço dois filmes baseados na mesma história.). E o curioso é que quem me perguntou "Quem é ela?" foi a mesma pessoa que falou "Como você, tão inteligente, pode defender a Dilma." semanas atrás. Então eu tive que explicar quem foi o Nikita Khrushchov, e ainda tive que explicar a piada (Não vou explicar a piada. Sigam o link para entendê-la.).

Esta pessoa me falou que não estudou história. Fez um segundo grau técnico e foi depois para uma faculdade de computação. Fiquei mais espantado ainda como esta pessoa só aprendeu o que "seria útil". História é uma das coisas mais importantes que se tem para aprender. E talvez por eu gostar de história eu tenho um entendimento tão diferente do que está acontecendo do que esta pessoa, e deste grupo todo.

Então talvez a frase "Como você, tão inteligente, pode defender a Dilma." devesse ter sido ao contrário, ou ter tido a resposta "Por ser tão inteligente é que eu defendo a Dilma.". Esta pessoa não julgou que poderia ser ao contrário do que ela pensa, e acha que todos tem que pensar como ela, que o que ela acredita é o certo. Eu gosto de brincar de hipóteses contrárias, e inverter pensamentos para testar hipóteses. (Sim, parece que estou me gabando, anunciando que sou o bonzão, superior a todos, e se você pensou isto é sinal que você está pensando, mas não é sinal que não pensei também. E inverti o pensamento aqui.)

Mas tem outra coisa interessante nisto. O ensino que esta pessoa teve é só técnico, sem história (e talvez outras coisas, como geografia, física, biologia etc, ou tendo isto tudo só para constar). Isto faz lembrar os cursos que te "preparam para o mercado de trabalho". Será que estes cursos só estão interessados em formar "meios de produção", e não cidadãos? Será que estas pessoas são vistas somente como "recursos" em projetos por serem somente "meios de produção", como uma ferramenta, uma máquina etc.

Não sou contra cursos que te "preparam para o mercado de trabalho". Acho que todo o segundo grau, ou quase todo, deveria ensinar uma profissão. Mas não só "preparar para o mercado de trabalho", e sim, preparar para a vida, para ser um cidadão consciente, que examina as coisas racionalmente, que pense por si só e não aceita cegamente o que lhe dizem, alguém tolerante, perspicaz para perceber manipulações etc. E racionalidade e perspicácia é o que menos tenho visto por aí ultimamente.

As pessoas tem que ganhar a vida, mas não só ganhar a vida, pois tem que viver também, pensar também. As pessoas tem que ser produtivas no trabalho, e além dele.

Será que boa parte da classe média que protestou no domingo 15/03/2015 é de gente "preparada para o mercado de trabalho", é fruto deste sistema de educação massificado que prepara "meios de produção"? Gente que até ganha uma boa grana, mas não foi preparada para a vida como cidadão.

Sim, tem muitos elementos marxistas nesta análise (Parabéns para quem percebeu.). Sou marxista. E se você acha que marxismo é um bando de malucos invadindo terras, tomando casas, União Soviética, Cuba, comedores de criancinha etc, você realmente tem uma deficiência séria na sua formação. O marxismo é principalmente um conjunto de ferramentas para entender a sociedade e a economia.

Eu não conheço muita coisa de Paulo Freire (Vergonha minha.), mas tem uma frase atribuída a ele que se encaixa quase perfeitamente no que assisti.

"
Seria uma atitude muito ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que permitissem às classes dominadas perceberem as injustiças sociais de forma crítica.
"

Isto, que já me fazia sentido, agora fez mais sentido ainda.

Um comentário:

  1. Realista essa analise!Penso dessa forma tambem!A luta para que se reconheca que o caminho viavel sempre sera pelo conhecimento de saberes e o que nos move! Adorei o texto!

    ResponderExcluir